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  • Foto do escritorBruna

Só de tu

Na minha última aparição por aqui, falei rapidamente sobre o meu desconforto e a minha falta de habilidade em me colocar como ponto central da minha escrita. Disse, e acredito que você possa concordar, que é mais fácil se apoiar em um nós – a história fica até mais interessante quando é vivida por mais gente, né? Hoje, eu vou falar de outra pessoa que, vez ou outra, me deixa reflexiva e me coloca em situações de escolha, algo difícil para uma libriana: a segunda pessoa do singular.

 

Sou recifense e o tu impera absoluto em Pernambuco e no meu vocabulário. Tão absoluto que o verbo nem precisa acompanhá-lo em uma conjugação perfeita: tu visse, tu falasse, tu comesse, tu viu, tu falou, tu comeu. Raramente falo você. Para mim, o você afasta e é para pessoas com as quais eu não tenho intimidade (ou para o plural) e o tu, curtinho como é, aproxima, é divertido e soa bem. Porém, apesar de todo o meu apreço pelo tu, quando vou estabelecer uma conversa com “o leitor”, acabo empregando o você. Não sei se isso acontece por causa dos textos que consumo ou por uma vontade implícita de manter certa distância entre a gente... Será?

 

Fato é que sempre que meu tu vem acompanhado do verbo conjugado na terceira pessoa, o corretor adiciona aquele sublinhado duplo e eu só tenho duas opções: corrijo a conjugação ou troco por você. Nenhuma delas me satisfaz completamente, mas, como se cometendo um crime hediondo ao não seguir algumas regras do “bom português”, cedo. Preciso dizer, no entanto, que a substituição por você não é, de jeito algum, natural e acrescentar um “s” ou o sufixo correto depois do tu é extremamente estranho e menos natural ainda. É provável que eu nunca tenha falado “tu estejas” em voz alta, e em português, como escrevi no post passado.

 

O título desta postagem, também título de uma canção da olindense Academia da Berlinda, exemplifica outro impasse quando vou escrever: o emprego correto do pronome oblíquo tônico após a preposição. Aqui chove de tu, pra tu e – pode acontecer – com tu. P(a)ra ti é polido demais, quase elitista; só de ti não tem força, não casa com o ritmo. (contigo me agrada).

 

Nesta semana, terminei a leitura de Como se encontrar na escrita: o caminho para despertar a escrita afetuosa em você, de Ana Holanda, um livro repleto de dicas e exemplos sobre como podemos escrever de forma mais verdadeira e conectada com a história e seus personagens. Logo no início, Ana nos convida a tentar descobrir qual é a nossa voz. De que forma devemos contar uma história para que ela gere conexão entre quem escreve, quem lê e quem protagoniza? Acredito que tenha sido por isso que comecei a pensar sobre o tu e sobre as divergências entre a minha oralidade e a minha escrita. Até que ponto escrever tu esteja “empobreceria” o meu texto, como dizem? O coloquialismo aproxima ou afasta? Aproxima ou afasta de quem?

 

Enquanto pensamos e tentamos encontrar a(s) nossa(s) voz(es), bora ouvir Só de tu, que tem tu e tem você à vontade.




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